JULGAMENTO DO GATINHO

Uma pessoa teve o seu gato de estimação envenenado por um vizinho. Ao contrário da maioria das pessoas, ela não teve medo e procurou fazer justiça a seu gatinho que não teve como se defender e morreu. Ela deu-se o trabalho de providenciar provas, evidências e testemunhas que não se omitiram covardemente como faz a maioria das pessoas. Ao contrário, compareceram nas audiências e contaram o que viram. Encontraram tempo, não se omitiram, não tiveram medo, buscaram a justiça e conseguiram fazer justiça. Que sirva de incentivo pela busca da justiça a todos os animais vítimas da maldade humana.

Quem quer fazer dá um jeito; quem não quer, inventa uma desculpa.

Texto enviado ao desembargador sobre o caso do gatinho.

Assunto: JULGAMENTO GATINHO
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. ENVENENAMENTO DE ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. PROVA TESTEMUNHAL CONCLUSIVA.

A prova coligida aos autos permite concluir que o envenenamento do animal decorreu de ato voluntário praticado pelo demandado, com o intuito de produzir determinada consequência – morte, em virtude do seu desagrado com a presença do gato no condomínio, o que restou cristalino na prova oral colhida em audiência, inclusive, em seu depoimento pessoal.

O dano moral sofrido pela parte autora é evidente, mormente se tratando de pessoa já sensibilizada quanto ao tema, que acolheu um animal de rua, com sinais de maus-tratos, dedicando-lhe todos os cuidados exigidos pela médica veterinária. São presumíveis as consequências operadas em quem perde abruptamente um animal de estimação, especialmente mediante uma atitude extremamente censurável como a dos autos, que merece ser coibida. Ressalte-se que se tratava de um ser indefeso, o qual, por ser domesticado e devidamente tratado contra doenças, não apresentava qualquer risco à saúde humana.

Quantum indenizatório mantido, pois fixado de acordo com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

VERBA HONORÁRIA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

Apelação Cível
Nona Câmara Cível
Nº 70036382869
Comarca de Canoas
MARIO ORLANDO JACINTO DOS SANTOS MADEIRA
APELANTE
JUSSARA BOTH HILGERT
APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento à apelação.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DESA. MARILENE BONZANINI (PRESIDENTE E REVISORA) E DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY.
Porto Alegre, 27 de abril de 2011.

DES. MÁRIO CRESPO BRUM,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Mário Crespo Brum (RELATOR)
Trata-se de recurso de apelação interposto por MÁRIO ORLANDO JACINTO DOS SANTOS MADEIRA em face da sentença que, nos autos da ação indenizatória movida por JUSSARA BOTH HILGERT, julgou a lide procedente, condenando o demandado ao pagamento de R$ 5.000,00, a título de reparação por danos morais, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, desde a data da publicação da sentença, e acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso até o efetivo pagamento. Em virtude do resultado, o requerido restou condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao procurador da autora, fixados em 20% sobre o valor da condenação, cuja exigibilidade restou suspensa em virtude do deferimento da gratuidade de justiça (fls. 119/122).
Em suas razões recursais, o apelante asseverou que a parte autora fez somente acusações infundadas, sem qualquer prova que possa dar suporte às suas alegações. Referiu que a decisão está embasada no depoimento da testemunha Joice Cristina da Silva Barcelos, o qual se apresenta confuso e contraditório. Aduziu que a depoente, além de não lembrar da data do fato, simplesmente deduziu que o demandado estaria oferecendo alguma coisa para o animal envenenado, o que não é digno de credibilidade. Afirmou que inexistem elementos para o juízo de condenação, o qual foi amparado em suposições não relacionadas a qualquer indício de prova. Por fim, salientou que a autora sofreu trauma na infância relacionado à morte de seu animal de estimação, provocada por seu pai, o que gerou consequências psicológicas graves. Caso mantida a condenação, postulou a redução do quantum indenizatório, pois é pessoa simples, que vive de uma pequena aposentadoria. Pediu provimento ao apelo (fls. 125/134).
Contrarrazões às fls. 138/146.
É o relatório.
VOTOS
Des. Mário Crespo Brum (RELATOR)
Eminentes Colegas.
A matéria devolvida pelo recurso de apelação cinge-se à verificação da existência de nexo causal entre o envenenamento do animal de estimação da parte autora e eventual conduta do demandado, seu vizinho, e à existência do dever de indenizar.
A irresignação não merece prosperar.
O laudo de necropsia juntado à fl. 19 dos autos atesta que o exame macroscópico e microscópico realizado no animal é compatível com o diagnóstico de intoxicação, ao passo que a análise toxicológica dos restos de peixe (sardinha) encontrados no local, bem como o exame das vísceras do felino acusaram a existência de organofosforados (inseticidas). Conforme a análise, atribui-se a causa-mortis à insuficiência respiratória, entretanto lesões internas e quadros hemorrágicos podem ocorrer quando em elevada dosagem e em animais sensíveis, em especial nos gatos (fl. 31). Portanto, inconteste que a morte do animal decorreu de envenenamento, mediante a colocação de inseticida no pedaços de peixe que lhe foram dados. Resta aquilatar se houve responsabilidade do réu quanto ao ocorrido.
Diferentemente do que sustenta o recorrente, a prova coligida aos autos permite concluir que o envenenamento do animal decorreu de ato voluntário seu, com o intuito de produzir determinada consequência – morte, em virtude do seu desagrado com a presença do gato no condomínio, o que restou cristalino na prova oral colhida em audiência, inclusive, em seu depoimento pessoal, no qual o demandado afirma que não gosta de animais, e acredita que a sua convivência com as pessoas pode ser prejudicial à saúde (fl. 92).
A testemunha Paulo, síndico do condomínio à época dos fatos, narrou que foi procurado pelo requerido, que lhe entregou uma sacola com dejetos e relatou que o animal estaria sendo criado solto no local, o que não era admitido. Aduziu que o réu pediu-lhe que tomasse providências, senão ele mesmo as tomaria. Acrescentou que, durante sua administração, nenhum outro condômino apresentou reclamações quanto ao gato (fl. 93).
Por sua vez, a testemunha Joice Cristina, que costumava trabalhar durante as madrugadas e residia em frente às casas dos litigantes, narrou que viu o réu, à noite, “agachado no pátio da autora dando alguma coisa para o animal. Percebeu que Mário estava dando algo para o animal pelo movimento que ele fazia. Não viu o que estava sendo dado. Tem certeza de que se tratava de Mário pela visibilidade que tinha, pois as casa são próximas e o condomínio é iluminado”  (fl. 94). Embora a depoente não tenha visto o animal, sabia que este ficava, normalmente, embaixo do carro da autora, não havendo razão outra para que o requerido se encontrasse no terreno da parte autora, naquelas circunstâncias, agachado junto ao seu carro, que não atrair o animal.
Outrossim, a argumentação no sentido de que o gato teria medo do demandado, razão pela qual não teria se aproximado ou aceitado o alimento, é insuficiente para a afastar as assertivas da inicial, pois o animal foi atraído com peixe, alimento apreciado por gatos, e, ainda que não tenha chegado perto do réu, é possível que tenha voltado ao local para comer o que foi ali deixado.
Destarte, não havendo registro de reclamações por parte de qualquer outro condômino quanto à presença do animal, mas tão-somente do réu, o qual afirmou que tomaria, por conta própria, as “providências” necessárias, caso o síndico não as tomasse, e, sobretudo, considerando que se trata de condomínio fechado, cujo acesso é restrito, em tese, à moradores e visitantes, é possível afirmar, diante do contexto probatório, que o apelante foi responsável pelo evento narrado nos autos.
De outro lado, o dano moral sofrido pela parte autora é evidente, mormente se tratando de pessoa já sensibilizada quanto ao tema, que acolheu um animal de rua, com sinais de maus-tratos, dedicando-lhe todos os cuidados exigidos pela médica veterinária. São presumíveis as consequências operadas em quem perde abruptamente um animal de estimação, especialmente mediante uma atitude extremamente censurável como a dos autos, que merece ser coibida. Ressalte-se que se tratava de um ser indefeso, o qual, por ser domesticado e devidamente tratado contra doenças, não apresentava qualquer risco à saúde humana.
Sendo assim, impositiva a manutenção da condenação, em todos os seus termos, pois o valor arbitrado mostra-se adequado para compensar o dano sofrido e atender ao caráter punitivo-pedagógico da medida.
Por fim, quanto aos honorários advocatícios, merece ser mantido o percentual, pois, na sua fixação, foram consideradas as peculiaridades do caso concreto, a natureza da causa e o trabalho desenvolvido pelo advogado, consoante os critérios estabelecidos no artigo 20, § 3º, do CPC.

Diante do exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação.

Desa. Marilene Bonzanini (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Tasso Caubi Soares Delabary - De acordo com o(a) Relator(a).

DESA. MARILENE BONZANINI - Presidente - Apelação Cível nº 70036382869, Comarca de Canoas: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO."

Julgador(a) de 1º Grau: ADRIANA ROSA MOROZINI

Colaboração de Sheila Campos

Um comentário:

  1. Se vivemos em uma sociedade humanizada, os animais teriam o apreço devido ao que nos proporcionam de contato com a natureza, mesmo que domesticada. Fato é que os animais colaboram com a nossa existência desde os tempos idos,nos quais os cães protegiam as cavernas e os gansos protegeram Roma da invasão, gatos foram usados por exército contra os egípcios, por respeitarem estes animais como sagrados, assim como quase toda a fauna. Dizemos isto de uma civilização que perdurou por mais séculos que a romana, que teve respeito por animais considerados como sagrados, sem precisar irmos ao oriente extremo , mas recorrendo a base da civilização mediterrânea. Enfim, que o Direito cumpra a sua função de "educar" coercitivamente, punindo os que não conseguem viver em mínimo estado de harmonia com o seu meio. Penso que aqueles que maltratam covardemente um animal podem em princípio fazer o mesmo com humanos desprotegidos, como crianças ou idosos.

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